Total de visualizações de página

domingo, 18 de setembro de 2016

O fim das CPIs



Antes acabavam em pizza. Agora, segundo investigações da Lava Jato, servem para políticos favorecerem empresários

Por Sergio Praça, 04/07/2016,
 www.veja.com.br

É difícil ser pessimista com o combate à corrupção no Brasil desde 2014. A Operação Lava Jato, aparentemente sem fim, tem desvendado esquemas complexos e, graças a novas leis, ao trabalho do juiz Sérgio Moro e decisões do Supremo Tribunal Federal, os responsáveis têm sido punidos. O poderoso empreiteiro Marcelo Odebrecht está há mais de um ano na cadeia.

Mas entre tantas instituições de combate à corrupção como a Controladoria-Geral da União (CGU), Judiciário, Ministério Público Federal, Polícia Federal e Tribunal de Contas da União, a ausência de comissões parlamentares de inquérito eficazes é conspícua.

Aliás, pior do que ausentes, as CPIs têm sido desmascaradas como instâncias de chantagem a empresários e manipulação de dados para fins corruptos. Até onde consegui pesquisar, a CPI do Banestado, em 2004, foi a primeira a registrar suspeitas desse tipo de atitude dos parlamentares. Um vereador de São Paulo foi preso ao achacar empresários supostamente respaldados por integrantes da CPI, entre eles o relator (José Mentor, PT) e o presidente (Antero Paes de Barros, PSDB). Nada foi provado até agora, apesar de as histórias serem contadas e recontadas em Brasília.

Com todas as novidades da Lava Jato sobre as relações ilegais entre doleiros e políticos, a postura atribuída a esses parlamentares não surpreende.

A Lava Jato trouxe à tona o principal caso, até agora, de CPI usada para proteção de criminosos. Trata-se do falecido senador Sérgio Guerra, ex-presidente nacional do PSDB. Titular da CPI da Petrobras em 2009, Guerra foi flagrado conversando com Paulo Roberto Costa, então diretor de Refino e Abastecimento da empresa, o deputado Eduardo da Fonte (PP) e o lobista Fernando Baiano – além de dois representantes de empreiteiras.  (Leia aqui a íntegra da conversa.)

O combinado era que Guerra evitasse que a CPI tratasse das obras da refinaria de Abreu e Lima, em Pernambuco. “Tenho horror a CPI”, disse o então senador. “Vamos fazer uma discussão genérica.” Paulo Roberto Costa não foi convocado pela comissão e, de acordo com o Ministério Público Federal, Guerra teria recebido R$ 10 milhões em troca.

Durante a conversa, Sérgio Guerra diz que “[ouviu falar que] a refinaria de vocês está dez por cento acima do preço”. De fato, o Tribunal de Contas da União apontou graves irregularidades na obra. Em entrevista ao “Roda Viva” em abril de 2013, um ano antes de morrer, Guerra disse que na política “falta um compromisso mais seguro entre o discurso e a prática”. Em seus contatos com empreiteiros, o presidente nacional do PSDB parece ter mantido sua palavra.

O ex-senador Delcídio do Amaral (PT), que presidiu a CPI dos Correios (uma das comissões que investigou o “mensalão”), afirma que o senador Aécio Neves (PSDB) teria pressionado para postergar a quebra do sigilo bancário do Banco Rural pela comissão, e assim teria tido tempo para que dados comprometedores para o PSDB fossem disfarçados. Ao contrário de Sérgio Guerra, não há provas contundentes para além do depoimento de Delcídio que incriminem Aécio.

Se comissões parlamentares de inquérito são instrumentos da minoria parlamentar – ou seja, da oposição – para revelar desmandos do governo, por que elas estariam sendo usadas para outros fins? Uma hipótese é que a competição virtuosa entre instituições de combate à corrupção elimine a possibilidade de deputados e senadores serem vistos como combatentes da corrupção alheia. Afinal, a CPI pode apenas fazer recomendações de punições ao Ministério Público Federal. Atualmente os brasileiros esperam não apenas discursos e investigações, mas também punição dos corruptos e corruptores. E isso só a Justiça pode dar.

Nenhum comentário:

Postar um comentário