Políticos e empresários envolvidos no escândalo da Petrobras tentaram —
e vão continuar tentando — sabotar as investigações
Por Daniel
Pereira, Thiago Bronzatto,
23/09/2016, www.veja.com.br
Desde a sua deflagração, em março de 2014, a
Lava-Jato enfrenta adversários poderosos. O PT acusou o juiz Sergio Moro de ser
uma marionete a serviço das multinacionais do petróleo ávidas para abocanhar as
reservas do pré-sal. O governo de Dilma Rousseff tentou emplacar juiz em
tribunal superior com a missão de soltar empreiteiros presos dispostos a abrir
o bico. Numa manobra suprapartidária, parlamentares tentaram aprovar medidas
para restringir acordos de delação e manietar a Polícia Federal e o Ministério
Público. Advogados de bancas abastadas lançaram manifesto comparando a
Lava-Jato às barbaridades da Inquisição. Todas as manobras tinham o objetivo de
“estancar essa sangria”, para ficar na definição imortal do senador Romero
Jucá, presidente do PMDB e um dos investigados no caso.
Até agora, tudo fracassou. Lula, o presidente mais
popular da história recente, tornou-se réu pela segunda vez na semana passada.
Marcelo Odebrecht, dono da maior empreiteira brasileira, está preso desde junho
de 2015. Eduardo Cunha, outrora o suserano da Câmara, perdeu o mandato e o foro
privilegiado. Os fracassos sucessivos, no entanto, não têm desestimulado os
complôs contra a Lava-Jato. Na Itália, berço da Operação Mãos Limpas, que serve
de inspiração aos investigadores brasileiros, os mãos-sujas tiveram relativo
sucesso ao contra-atacar — e o Brasil precisa evitar a repetição aqui do
desfecho de lá. Uma ofensiva vexaminosa ocorreu na segunda-feira passada,
quando a Câmara tentou aprovar uma anistia para quem fez caixa dois nas últimas
campanhas eleitorais.
Como toda operação clandestina, o texto da anistia
nem sequer foi apresentado. Circulou como espectro, correndo à boca miúda nas
conversas em plenário, mas sem pai nem mãe. A ideia era formalizá-lo na calada
da noite, sem publicidade, e aprová-lo a toque de caixa, à sorrelfa da opinião
pública. O plano só não deu certo porque deputados do PSOL e da Rede, a
combativa minoria do Parlamento, descobriram e denunciaram a manobra, que o
deputado Ivan Valente, do PSOL paulista, batizou de “golpe da madrugada”. Pegos
em flagrante, os entusiastas da medida fingiram-se de mortos. É gente do PMDB,
do PSDB, do PT e, claro, do PP, a sigla mais enrolada no petrolão.
A anistia é um antídoto prévio à devastação
esperada com a delação de Marcelo Odebrecht, que deverá apontar o dedo para
150, 200 ou até 300 políticos, segundo se especula. Todos beneficiados com
dinheiro clandestino da empreiteira. Na relação, há casos de caixa dois e de
recebimento de propina, mas os envolvidos, ecoando o mantra criado pelo
ex-ministro Márcio Thomaz Bastos no escândalo do mensalão, alegam apenas ter
movimentado “recursos não contabilizados”. Se a anistia for aprovada em outro
golpe ou em outra madrugada, os políticos só serão condenados se restar
configurado o crime de corrupção, cuja comprovação é mais complexa.
A anistia tem o apoio dos grandes partidos porque
também organiza o cenário político, espantando os fantasmas que rondam o
governo Temer. Se avançar, a anistia elimina a possibilidade de o Tribunal
Superior Eleitoral (TSE) cassar a chapa Dilma - Temer, sob investigação por
suspeita de caixa dois. Quando corriam as negociações para aplicar o golpe da
madrugada, o PSDB chegou a defender a aprovação de uma anistia apenas criminal,
mas não eleitoral. Assim, o PMDB não se livraria do risco de perder a Presidência
da República por decisão do TSE, permanecendo com a espada sobre a cabeça.
Assim, os tucanos continuariam a ter no bolso do colete um instrumento de
pressão sobre o governo Temer. Os tucanos, no entanto, ao perceberem que a
ideia dificultaria o caminho do golpe, recuaram. Afinal, eles querem disputar o
Palácio do Planalto em 2018, e não antes. Até lá, esperam que Temer arrume a
casa e se desgaste nos esforços para aprovar o ajuste fiscal e as reformas
impopulares, como a trabalhista e a previdenciária.
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