Presidente afastado da Câmara diz
que a presidente afastada da República lhe ofereceu a ajuda de membros da corte
máxima do país e que foi ele quem não aceitou negociar o impeachment em troca
de sua salvação no Conselho de Ética
Por Reinaldo
Azevedo, 16/05/2016,
www.veja.com.br
Em entrevista à Folha publicada no
domingo, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara afastado, negou que
tenha chantageado o governo, como acusam Dilma Rousseff, presidente da
República também afastada, e José Eduardo Cardozo, ex-advogado-geral da União.
Segundo Cunha, o que se deu foi
precisamente o contrário. Em quem acreditar? Ora, acredito nos fatos. E estes
estão mais próximos da versão de Cunha. Não só! Ele diz que o governo de então
lhe ofereceu duas vezes uma suposta ajuda de cinco ministros do Supremo: a
primeira oferta teria sido feita pela própria Dilma; a outra, por intermédio do
governador do Rio, Luiz Fernando Pezão. Vamos ver.
Cunha pôs para tramitar a denúncia
contra Dilma no dia 2 de dezembro do ano passado. A votação do Conselho de
Ética (depois anulada), favorável à sequência do processo contra Cunha, só
aconteceu no dia 15. O deputado afastado diz ter testemunhas que provam que
Jaques Wagner o procurou para negociar, mas ele teria se recusado a atender o
então chefe da Casa Civil.
Ora, basta recuperar o noticiário dos
dias que antecederam a decisão de Cunha. A personagem mais buliçosa, que se
movimentava pra lá e pra cá, era ninguém menos do que o próprio Lula, que
defendia, sim, uma trégua com Cunha. No dia 1º de dezembro, um dia antes de o
então presidente da Câmara aceitar a tramitação da denúncia contra Dilma, o
deputado petista Zé Geraldo (PA), um dos três membros do partido no Conselho de
Ética, afirmou o seguinte: “Eu defendo que devemos votar pelo país, não pelo
Cunha. Não acreditamos no Cunha, mas o que pode acontecer no país amanhã pode
ser o pior dos mundos”. Vale dizer: ele defendia abertamente que se salvasse o
peemedebista.
Isso parece indicar, pois, que o PT
estava propenso ao acordo. Mais: não é segredo para ninguém que Lula ficou
descontente com as manifestações públicas de petistas contra Cunha. Alertou que
o partido teria de arcar com as consequências. Pensemos mais um pouco.
Na entrevista à Folha, o deputado
afastado diz que escolheu o dia 2 de dezembro porque era aniversário da filha —
parece ironizar as razões familiares constantemente alardeadas por seus pares
ao dizer “sim” ao impeachment — e porque sabia que o Congresso estava prestes a
mudar a meta fiscal, o que daria argumento ao Planalto para afirmar que os
crimes fiscais cometidos crimes não eram. Verdade ou mentira?
Bem, uma coisa é certa: ele poderia ter
esperado mais duas semanas para decidir. Ou por outra: poderia ter aguardado a
votação no Conselho de Ética, tomando a sua decisão, pois, já conhecendo os
votos dos petistas. Ademais, uma coisa é inquestionável: pondo a denúncia para
tramitar, não haveria a menor possibilidade de contar com os votos dos
companheiros. Logo, a lógica elementar indica que foi Cunha quem pôs fim à
negociação, não o governo ou o PT.
Se aconteceu, grave mesmo em toda essa
história é a oferta feita por Dilma: a colaboração de cinco ministros do
Supremo. Cunha diz não saber quais, o que é, convenham, estranho. Se a
generosidade foi posta à mesa, fica difícil supor que não se tenham citado os
nomes. Talvez cunha pretenda guardar a informação como um trunfo.
Cardozo nega que isso tenha acontecido.
Ocorre que, depois das lastimáveis intervenções deste senhor no processo de
impeachment, que contribuíram para desmoralizar a própria AGU, fica difícil
acreditar nele. Mas dá para acreditar em Cunha? Pois é… Não seria a primeira
vez que o governo Dilma teria tentando pescar nas águas turvas de tribunais
superiores, não é mesmo?
Seja como for, vamos aplaudir: o acordo
não aconteceu, e o país tem ao menos a chance de sair do atoleiro.
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