Por Augusto Nunes, 24/04/2016,
www.veja.com.br
Texto
de Valentina
de Botas
“Não vou até aí, é muito perigoso; espera o pessoal
do seguro, e quando você chegar, te faço uma massagem”. Passava da meia-noite e
uma amiga querida, para quem confesso até meu IMC, ouviu ao telefone o marido
confirmar a rotina daquele casamento unilateral: que não contasse com ele.
Professora universitária num curso noturno, voltava para casa e o carro
enguiçou nos ermos do trajeto obrigatório. Quando me ligou em seguida, não me
surpreendi com o relato na voz de choro contido: “Não acredito”, disfarcei
acolhendo a angústia dela e fui ajudá-la.
O PSDB que, na oposição há 13 anos, receou fazer
oposição por 13 anos, dobra a meta e também receia integrar o governo Temer.
Faz cálculos adequados a essa conduta patética diante da possibilidade de José
Serra ser ministro de Temer – receia que o governo seja bom e receia que seja
ruim: na primeira hipótese, Serra chega fortalecido à disputa de 2018, atrapalhando
outros tucanos presidenciáveis; e, na segunda, Serra enfraquecido atrapalha
outros tucanos presidenciáveis.
O partido só não receou excluir o país de cálculos
que envolvem covardia e oportunismo elevados à potência da estupidez: o Brasil
talvez não possa contar com o PSDB agora e o PSDB espera contar com o Brasil em
2018. Perfeitamente, senhores. O partido desfigurou-se sob o lulopetismo, num
trabalho incansável por meio do silêncio cúmplice na narrativa canalha que
deturpou a história do Plano Real, causando a extinção do precioso legado que,
hoje, é só doída lembrança do que poderíamos ter sido.
Legado que não contempla somente princípios
econômicos e fiscais, como a domesticação da inflação e a conseqüente
normalização do cotidiano, condição fundamental para haver futuro – mas que
remete, sobretudo, à última vez em que os interesses do país foram projeto de
governo. Nesses 13 anos miseráveis, enquanto o nível de testosterona política
dos tucanos declinava a ponto de se limitarem a hesitantes campanhas
eleitorais, os brasileiros indignados não recuaram da oposição real unindo com
pontes incertas ilhas esparsas de resistência.
Agora, os tucanos forjam com medinhos e nojinhos um
dilema artificial para refúgio contra os perigos de fazer política, agendando
um encontro com a irrelevância. Ela avisa que topa. Uma pena, pois o partido
reúne quadros genuinamente democratas que somam honestidade e competência.
Integrar um governo é aspiração legítima de qualquer partido que, depois de
ajudar a destituir legalmente o anterior mafioso, passa à obrigação se
convidado. Concorrer à presidência é aspiração naturalíssima de qualquer
político; ilegítimo é fazê-lo por covardia ou oportunismo como o PSDB ameaça;
por dissimulação como a Rede de Marina Silva; e pela delinquência como a
escória lulopetista.
No silêncio de constrangimento tão sólido que se
tornava outro passageiro, eu adivinhava o choro da minha amiga, é duro acabar
um casamento mesmo quando ele está acabado. Vazia da palavra ou do olhar certos
para a delicadeza da situação estendi-lhe a mão sem olhar, só para que
percebesse minha presença como companhia. Na retribuição do gesto, consegui
perguntar se a tal massagem valia mesmo aquela sofrência toda. Rimos tanto que
quase batemos o carro: posso ficar uns tempos na sua casa até alugar um
aparamento e tal? Claro que podia.
Numa nota para o site O Antagonista, o senador
Aloysio Nunes, com a assertividade costumeira, apontou o absurdo da estratégica
eminente do PSDB. Se os tucanos não o ouvirem, se o país não puder contar com
eles para o conserto de que precisa para chegar a um lugar seguro, que se
preparem para, em 2018, massagearem-se uns aos outros.
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