Amigo da onça de Temer, Geddel
informa que estenderá a Lula mão que pode afundar chefe: é tolo ou traíra?
Por Augusto
Nunes, 17/05/2016,
www.veja.com.br
O ministro da Secretaria de Governo e responsável
pela articulação política de Michel Temer, Geddel Vieira Lima (PMDB-BA),
informou que vai procurar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que
este ajude o governo a buscar saídas para a atual crise política e econômica do
país. Em entrevista a Erich Decat, publicada domingo pelo Estadão, Geddel,
que foi ministro do petista, disse: “Não tenho nenhuma dificuldade de diálogo
com o ex-presidente e tenho certeza de que, passado esse momento de emoção, o
Lula, na condição de ex-presidente, haverá de dar sua contribuição para o
distensionamento”.
A proposta do articulador do novo governo é uma
ideia de jerico e a entrevista, um desastre do começo ao fim. Demonstra, acima
de tudo, completo desconhecimento da alma do ex-chefe e atual adversário, da
natureza humana em geral e, em particular, da estratégia de combate político
dele. O ex tem dado diariamente provas de que não merece mais a definição de
gênio – nem mesmo de craque – da política com que já foi designado, inclusive
pelo autor destas linhas, várias vezes. Ao contrário, a forma como tem atuado,
principalmente ao longo do segundo governo de sua afilhada, escolhida e
protegida, tem desmanchado fio a fio a teia em que enredou seu presente, as
chances de seu Partido dos Trabalhadores (PT) e, sobretudo, o futuro de todos
os que lhes estão próximos. Dar a mão de vencedor ao derrotado, neste momento,
é se oferecer ao abraço do afogado. Por inabilidade ou sede de protagonismo,
que terminou demonstrando que não merece, o baiano só pode é criar embaraços
para o novo chefe, do qual deveria receber dura reprimenda. Caso não o
desautorize publicamente, o presidente em exercício dará sinais de falta de
comando sobre a própria equipe, o que na atual conjuntura poderá tornar-se até
fatal para ele.
Uma aulinha banal de História precisa ser dada ao
ministro, que, inebriado pelo poder, ao que parece, nem se lembra de fatos
recentes, que se tornarão o epílogo de um relato que já começa por mostrar a
falta de equilíbrio, oportunidade e sensatez do palpite infeliz.
Quando era presidente do Sindicato dos Metalúrgicos
de São Bernardo e Diadema, hoje do ABC, nos anos 70, e depois das greves que
liderou na virada para os 80, foi sugerido a Lula um gesto de conciliação que
lhe daria, ainda antes de começar sua carreira política, uma chance de ouro de
entrar para a História do país pelo portão da frente. O general Golbery do
Couto e Silva, então chefe da Casa Civil do último governo da ditadura militar,
sob a chefia do general João Figueiredo, mandou o então presidente do diretório
paulista do partido do governo em São Paulo, Cláudio Lembo, pedir o apoio do
arcebispo dom Paulo Evaristo cardeal Arns e de Lula à anistia dos exilados
políticos brasileiros. Dom Paulo estendeu a mão, mas o dirigente sindical
recusou-se a imitá-lo.
Seu gesto foi tão brusco e surpreendente que o presidente
Figueiredo imaginou que o bruxo da “Sorbonne” – como então era conhecida a
Escola Superior de Guerra (ESG) – podia estar mentindo. Pediu ao maior
adversário de Golbery no Palácio do Planalto, o chefe do Serviço Nacional de
Informações (SNI), general Octavio Aguiar de Medeiros, que mandasse um agente a
São Paulo só para conferir. O então major Gilberto Zenkner encontrou-se com o
líder operário num apartamento do jornalista Alexandre Von Baumgarten, na
Liberdade, e ouviu dele próprio a confirmação de que não apoiaria a anistia
porque não admitia, depois, obedecer a ordens dadas por asilados que estavam no
“bem bom” enchendo a cara da melhor produção de vinho francês, em Paris.
Lula, que já atendera a pedido mais difícil de ser
atendido de Golbery ─ de desalojar seu arqui-inimigo Leonel Brizola das bases
sindicais ─, manteve-se alheio aos ex-guerrilheiros até que estes aceitaram
fundar sob seu comando o Partido dos Trabalhadores. O PT nasceu da fusão desses
militantes desarmados com católicos de esquerda (que Nelson Rodrigues chamava
de “padres de passeata”) e sindicalistas independentes em relação a comunistas
ou pelegos do PTB. Mas sob a égide de um líder acima de todos – ele mesmo,
claro.
Foi nesta condição que participou da campanha pelas
diretas já e da construção dos alicerces da Nova República, depois da derrota
da emenda Dante de Oliveira na Câmara. No entanto, expulsou do partido três
deputados da bancada petista – Airton Soares, Bete Mendes e José Eudes – que
ousaram desobedecer à sua ordem de não votar em Tancredo Neves. Porque, a seu
ver, este e o adversário, Paulo Maluf, seriam “iguais”. Isso não o impediria
de, depois, levar seu ungido para a Prefeitura de São Paulo, Fernando Haddad,
aos jardins da casa daquele que chamava de “filhote da ditadura”, na disputa
política para fazer de seu “poste” prefeito paulistano.
Tancredo morreu, o vice, José Sarney, assumiu a
Presidência e Lula foi eleito constituinte. Participou das sessões, teve seus
votos computados, mas resolveu proibir que os constituintes petistas assinassem
a Constituição dita “cidadã”, presidida por Ulysses Guimarães. Depois,
convencido pelo presidente da Constituinte, do PMDB e da Câmara dos Deputados à
época, além de eminência parda de Sarney, assinou a Carta tão discretamente que
até hoje há quem diga e escreva que ele não o fez. Também nunca fez questão de
confirmar nem desmentir esse recuo, do qual ele parece não ter se arrependido,
apesar de hoje, na luta para manter na Presidência a sua sucessora, Dilma
Rousseff, defendê-la com empenho que o próprio Dr. Ulysses nunca teve. Ou pelo
menos nunca o demonstrou.
Derrotado por Fernando Collor de Mello na primeira
eleição presidencial direta após 31 anos, participou ativamente da deposição
dele, mas ficou na oposição ao mandato-tampão do mineiro nascido em águas do
mar baiano. E condenou ao expurgo do PT a ex-prefeita de São Paulo, Luiza
Erundina, que aceitou chefiar o órgão que cuidava da administração pública no
governo que o partido ajudou a tornar viável, mas ao qual não quis dar sustentação.
Há uma explicação para isso: só lhe interessava chegar ao topo da República por
qualquer razão, sem ter de se aliar com ninguém, mas podendo se reservar o
poder de fazer vassalos em vez de aliados e inimigos no lugar de adversários.
Nada há que indique que ele tenha mudado agora.
Depois de seus dois mandatos e de ter escalado a substituta para mais dois,
enquanto a maior organização criminosa da História pilhava os cofres públicos,
e flagrados por descuido, ambição e arrogância, ele tenta emergir do naufrágio
da grei, agarrado à tábua de salvação do mito do melhor presidente da História
do Brasil. Construiu o muro da vergonha que divide os “brancos opressores da
elite” e os “pardos pobres e oprimidos”. Destilou ódio, fragmentou a Nação, as
famílias e as instituições apenas para tentar reconstruir a própria utopia
pessoal nas ruínas da maior crise moral, econômica e política de todos os
tempos. Inventou o golpe “parlamentar e jurídico” da burguesia, que estão
depondo sua protegida. Seus compadres também falidos da Sul-América bolivariana
fingem que acreditam nele, até porque também levaram os próprios povos à
bancarrota.
Içado do poço lulodilmista por Temer, Geddel
promete puxar o ex-presidente encrenqueiro pra cima. Isso na certa implicará
afundar o chefe bonachão. Dizem que Lula bebe. Mas é Geddel quem fica tonto.
Será tolo ou traíra?
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