Com a proibição do financiamento
eleitoral por meio de doações empresariais, os partidos e seus candidatos
viram-se diante do desafio de fazer uma campanha eleitoral de verdade
Por Augusto
Nunes, 17/10/2016,
www.veja.com.br
Editorial do Estadão
Causa espécie a informação, publicada no Estado,
segundo a qual, em 20 das 54 cidades que terão segundo turno das eleições,
candidatos propuseram acordo para reduzir o tempo de propaganda eleitoral que
lhes é oferecido de graça no rádio e na televisão, a expensas do contribuinte.
O mais comum e lógico é que os candidatos se
empenhem em conseguir mais, e não menos, exposição, a fim de divulgar sua
plataforma aos eleitores e, assim, em tese, ampliar suas chances de vitória. É
por essa razão, aliás, que os partidos médios e grandes, a cada eleição,
engalfinham-se na disputa por apoio de legendas nanicas, já que estas, embora
totalmente irrelevantes do ponto de vista político e de representação, têm a
oferecer preciosos segundos de propaganda eleitoral.
No entanto, algo mudou neste ano. Com a proibição
do financiamento eleitoral por meio de doações empresariais, os partidos e seus
respectivos candidatos viram-se diante do desafio de fazer uma campanha
eleitoral de verdade – bem diferente das bancadas a peso de ouro por generosos
empresários interessados em obter vantagens daqueles que ajudaram a eleger e
que transformaram os candidatos em meros produtos de marketing.
Assim, ao mesmo tempo em que tiveram de buscar
financiamento de pessoas físicas – isto é, dos eleitores –, os candidatos foram
obrigados a fazer propostas concretas para conquistar os votos e, no corpo a
corpo da campanha, ouvir o que os cidadãos têm a dizer e quais são suas
aspirações. É a isso que se dá o nome de política – coisa para a quais muitos
candidatos não precisavam ter o menor talento, pois se limitavam, na propaganda
de TV, a repetir o discurso criado pelo engenho de publicitários muito bem
remunerados. Não se apresentavam projetos, mas slogans, e os eleitores não eram
tratados como cidadãos, mas sim como “público-alvo”.
No atual cenário, não surpreende que muitos
candidatos se sintam desconfortáveis. A falta do dinheiro abundante das doações
empresariais queixam-se esses políticos, inviabiliza a propaganda eleitoral no rádio
e na TV tal como era feita até agora. Na opinião deles, sem os recursos
proporcionados pelo financiamento, fica difícil bancar peças publicitárias que
atraiam a atenção dos eleitores, restando como alternativa reduzir o tempo dado
a cada candidato. “Em uma época em que a população não está a fim de ouvir
falar sobre política, 20 minutos é muita coisa”, disse Vanderlan Cardoso (PSB),
que disputa a prefeitura de Goiânia.
Trata-se de um argumento falacioso. Para
apresentar-se aos eleitores e defender suas propostas no horário eleitoral
gratuito, basta que o candidato, diante das câmeras ou do microfone de rádio,
simplesmente fale. Até onde se sabe, especialmente em tempos em que celulares
se transformaram em câmeras, hoje em dia não há nenhuma dificuldade para gravar
mensagens políticas. O problema, portanto, não é falta de dinheiro. O problema
é não ter o que dizer.
“Se dependesse de mim, em vez do horário gratuito
teríamos apenas debates”, disse, em outubro de 1998, o então governador de São
Paulo, Mário Covas. Na opinião dele, essa seria “a melhor maneira de conhecer
os candidatos e seus programas”, e não por meio das cada vez mais caras
campanhas marqueteiras. Políticos como Covas no passado, que tinham algo a
dizer, não se intimidavam diante dos eleitores e jamais abririam mão da
oportunidade de lhes falar diretamente.
Mas os tempos, infelizmente, são outros. O dinheiro
fácil dos empreiteiros e bancos que vinha irrigando as campanhas eleitorais
desde 1994 parece ter criado uma geração de políticos incapazes de fazer
política. Sem saber como se comunicar com os eleitores, tornaram-se dependentes
dos anabolizantes publicitários.
Com a queda brutal dos gastos das campanhas – que
foram 71% menores neste ano em relação ao registrado em 2012, diante de uma redução
de 64% nas doações eleitorais no mesmo período, segundo dados do Tribunal
Superior Eleitoral, valorizam-se o eleitor e os que têm verdadeira vocação
para a política.
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