Não conseguimos sair da delegacia
de polícia para fazer políticas públicas
Por Reinaldo Azevedo, 02/12/2016,
www.veja.com.br
As coisas estão começando a ficar como
o diabo gosta. Já ficaram. Para onde caminhamos? Bem, perguntem aos
incendiários.
Nesta quinta, enquanto o Supremo
decidia se recebia ou não a denúncia contra Renan Calheiros (PMDB-AL),
presidente do Senado, membros do Ministério Público e juízes promoviam um ato
em uma das entradas do tribunal. Vamos ver: MP investiga e denuncia; juiz
recebe ou não a denúncia e julga. Esse tipo de militância, entendo, fere o
fundamento das duas funções. E daí? Juiz que prejulga a porta de tribunal pode
envergar a toga?
Estavam lá, disseram, para protestar
contra o que chamam criminalização do seu trabalho. Em Curitiba, também houve
protesto. Então ficamos assim: promotores e juízes reivindicam o direito de se
comportar como qualquer outra categoria profissional, inclusive na militância
sindical, mas exigem uma intocabilidade única, a ninguém garantida, nem ao
presidente da República.
No domingo, estão marcados alguns
protestos. A força-tarefa, que é a verdadeira organizadora da manifestação, já
deu a pauta. De forma deliberada, confunde-se o destrambelhado crime de
responsabilidade de juízes e promotores, aquela estrovenga aprovada na Câmara,
com o bom e sensato projeto que pune abuso de autoridade. No paralelo, é bom
lembrar, o que deixa a turma inflamada é a comissão que apura os supersalários.
O Poder que paga os vencimentos nababescos, como se sabe, é mesmo o Judiciário.
Promotores e juízes satanizam o Poder
Legislativo e tratam todos os políticos como bandidos. Alguns movimentos de rua
caem na conversa e aceitam, ora por cálculo, ora por ignorância, ser laranja de
incendiários e porras-loucas. Não fosse a coragem de uns poucos críticos, o
país corria o risco de ter um pacote de medidas anticorrupção de fazer inveja à
Coréia do Norte.
Vejam o número de políticos e empresários
que a Lava Jato já mandou para a cadeia ou está investigando. Em breve, vem a
penca da delação da Odebrecht. Será mesmo que o Ministério Público precisa de
leis de exceção? Segundo alguns de seus integrantes, sim! Querem ainda mais
poder. Mas que ninguém ouse sugerir que eles podem cometer um erro.
O Brasil está afundando. Não
conseguimos sair da delegacia de polícia para fazer políticas públicas. Não!
Ninguém quer impedir a Lava Jato. Esse é o mito mais cretino que os aspirantes
a ditadores do bem conseguiram espalhar. A economia dava tênues sinais de
recuperação, mas, na margem, a coisa já começa a engripar de novo. O estado não
tem dinheiro para investir, e os recursos privados não chegam num cenário de
incerteza.
As razões da crise econômica são
conhecidas. A crise política está sendo inflada artificialmente pelo
destrambelhamento institucional. Os entes da República já não respeitam nem o
espaço legal dos seus pares. Procuradores acham normal legislar e conseguem
convencer alguns incautos de que, bem…; se o Congresso não o faz, que o façam,
então, os de boa vontade. No STF, até para conceder um habeas corpus, um
ministro decide afrontar o Parlamento, atuando como legislador.
O país caminha para 13 milhões de
desempregados. A PEC que estabelece o teto de gastos é apenas um esbirro, bem
fraquinho, que pode sustentar por mais algum tempo um edifício que está prestes
a desmoronar. É preciso cuidar de outros pilares. A reforma da Previdência é
essencial. Encontrará um Parlamento conflagrado, achincalhado nas ruas — por
bons, mas também por maus motivos, talvez pouco disposto a aceitar a patrulha,
aí das esquerdas.
Os brasileiros deram aos homens da Lava
Jato a tarefa de fazer valer a lei, de optar pelo caminho seguro e sereno das
reformas. Mas seus extremistas querem brincar de revolução. A Câmara passou um
mês debaixo de vara em razão de uma fantasia: a tal anistia, que todos sabiam
ser impossível. Agora que está claro que aquilo nunca existiu nem poderia
existir, então o foco é a tal “criminalização de juízes e promotores”, outra
fantasia.
No PT, os de mais aguda vista voltaram
a sorrir. A direita burra está conseguindo fazer o que nem a esquerda
inteligente conseguiu: tornar o PT, de novo, um partido viável.
Um velho professor me ensinou quando eu
tinha 14 anos: nada é mais reacionário do que a burrice.
Adiante, incendiários do nada e
radicais do pouco.
Nenhum comentário:
Postar um comentário