Mirem-se no mau exemplo de um estado que deixou a folha inchar e deitou
na cama dos royalties
Por Ruth de
Aquino, 11/11/2016,
www.época.com.br
A pergunta, em tom dramático, foi feita a
empresários pelo ministro do Desenvolvimento Social e Agrário, Osmar Terra, em
defesa do ajuste fiscal do governo Temer. “Vamos deixar piorar? Com o Rio de
Janeiro aconteceu isso, gastou muito mais do que arrecadou, prometeu muito mais
do que pôde cumprir e acabou. Não consegue nem pagar a folha, nem os aposentados.”
Para Osmar Terra, “o Rio acabou”.
O Rio é um exemplo “didático” do que não deve ser
feito. Foi o adjetivo usado pelo ministro da Fazenda, Henrique Meirelles.
Mirem-se no mau exemplo dos gestores irresponsáveis e imprevidentes do Rio e
tentem frear o colapso. Mirem-se no mau exemplo de um estado que deixou a folha
inchar até explodir e que deitou na cama dos royalties do petróleo, vivendo na
farra sem pensar no amanhã. Uma mistura de má gestão, incompetência, falta de
planejamento, desperdício de recursos, prioridades erradas, mordomias e
desvios. Nenhuma economia resiste a isso.
O plano do governador Pezão é apelidado de “pacote
de maldades”. A maior maldade não passará: o confisco da remuneração mensal dos
servidores. Uma coisa é aumentar o desconto da Previdência de 11% para 14%.
Tudo bem. A outra é descontar 30% mensalmente de Previdência dos isentos e de
todos os servidores aposentados para ajudar a reequilibrar as contas do Estado.
Esquece, Pezão – parece que já esqueceu. É uma provocação em tempos bicudos e
um convite ao que vimos: o vandalismo na Assembléia Legislativa do Rio de
Janeiro, a Alerj, e o confronto com a PM.
O Rio de Janeiro não é o único estado sem dinheiro
e sem saber se pagará ou não o 13º aos servidores. Oito estados estouraram a
despesa de pessoal – Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul,
Paraíba, Distrito Federal, Goiás e Paraná, além do Rio. Salários já são pagos
com atraso ou em parcelas.
Mas, se fosse só isso... Na verdade, os servidores
são vítimas, mas também causa da calamidade dos cofres vazios. Pelos dados do
Tesouro Nacional, o Estado do Rio, entre 2012 e 2015, ou seja, em três anos,
aumentou seu gasto com pessoal de R$ 20,8 bilhões para R$ 31,6 bilhões; e o
gasto com inativos dobrou de R$ 5,2 bilhões para R$ 10,8 bilhões. É ralo que
não fecha.
A calamidade financeira já atinge os serviços
essenciais, na saúde e na educação. As cenas de penúria e sofrimento da
população pelo país afora, exibidas diariamente nos telejornais, lembram as da
Venezuela, quando o modelo populista de Hugo Chávez entrou em colapso. O estado
de Mato Grosso há cinco meses não repassa às prefeituras as verbas mensais para
a Saúde. No Distrito Federal, 40 mil alunos ficaram sem transporte escolar
porque as empresas não recebem o pagamento do governo estadual. Merenda
escolar? Sumiu em muitos estados.
Começamos a ver hospitais fechando, escolas
fechando, postos de saúde fechando. Os índices de criminalidade estão
aumentando. A ousadia dos bandidos cresce nas ruas. O orçamento da segurança
pública está à míngua. No Estado do Rio, três restaurantes populares que
serviam 7.500 refeições por dia foram fechados. Ao todo, são 16 os restaurantes
populares, mas o estado deve R$ 22 milhões às dez empresas responsáveis por
eles.
Mães com crianças de colo e velhos dão com a cara
na porta fechada dos postos de saúde. Uma folha de papel informa que o
atendimento médico foi suspenso por falta de equipamentos, manutenção,
profissionais e salários. Você se lembra das vítimas das tempestades de 2011 na
Serra Fluminense e em Niterói? Pezão quer suspender o Aluguel Social para quase
10 mil famílias desabrigadas. Ao mesmo tempo, o governo Pezão gastou, só de
janeiro a outubro, R$ 74 milhões com aluguéis de imóveis, R$ 34 milhões em
aluguéis de veículos, R$ 5,6 milhões em aluguéis de vagas de estacionamento, R$
7,2 milhões em passagens aéreas.
Tenta-se arrecadar na marra dos mais pobres, após
se abrir mão de bilhões de reais em impostos dos mais ricos, com as chamadas
renúncias fiscais. “Precisamos de medidas anticorrupção, de uma Lava Jato
fluminense para reaver verbas que sumiram em comissões. Com o que é proposto,
chegamos a uma solução parcial, mas não resolvemos a mega crise estadual”,
afirma Istvan Kasznar, professor de economia e administração pública da
Fundação Getulio Vargas do Rio. “As elites políticas pagam pouco desse ajuste,
e o povo paga tudo.”
Se ao menos se desse um basta à esquizofrenia. Mais
um trem da alegria (ou da tristeza?) foi aprovado na Câmara em Brasília:
aumento salarial para auditores fiscais e analistas da Receita Federal,
acompanhado de “bônus de eficiência”. O projeto, enviado pelo Executivo ao
Congresso, prevê impacto de R$ 8,5 bilhões até 2019 nas contas do governo
federal. Quem quer mesmo ficar igual ao Rio?
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