Ao formular a primeira denúncia
contra Lula por corrupção, o Ministério Público Federal acusa o ex-presidente
de ser o comandante máximo do esquema de desvios na Petrobras. Uma condenação,
e a conseqüente prisão, nunca estiveram tão próximas
Istoé,
16/09/2016,
www.istoé.com.br
Na última semana, a força-tarefa da Operação Lava
Jato alcançou o cume da organização criminosa responsável por sangrar os cofres
da Petrobras. Nas palavras do procurador Deltan Dallagnol, que coordena o grupo
de procuradores em Curitiba, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi o
“comandante máximo”, o “general” e “maestro” de uma “orquestra” baseada na
“propinocracia” “concatenada para saquear os cofres da Petrobras e de outros
órgãos públicos”. As contundentes declarações embasaram a primeira denúncia por
corrupção contra Lula, apresentada pelo Ministério Público Federal na
quarta-feira 14. Nunca antes o petista esteve tão perto de uma condenação e de
ser preso – além da possibilidade de se tornar ficha-suja, o que o
impossibilitaria de disputar as próximas eleições – o segundo revés que mais o
atemoriza no momento. Constam ainda no rol de denunciados a ex-primeira dama
Marisa Letícia, o presidente do Instituto Lula, Paulo Okamotto, o ex-presidente
da OAS Léo Pinheiro e outros quatro executivos.
NAS
CORDAS Para o MPF, Lula formou um colchão de recursos ilícitos para abastecer
futuras campanhas eleitorais, no contexto de uma perpetuação criminosa de poder.
AS ACUSAÇÕES PRINCIPAIS
Conforme antecipou a ISTOÉ em sua última edição,
configurou-se a tempestade perfeita e o cerco se fechou contra Lula de maneira
inapelável. No panorama traçado pelo Ministério Público, todos os elementos
levam à convicção de que o petista estava no comando dos desvios nos cofres públicos.
O objetivo seria obter uma governabilidade por meio da corrupção, nos mesmos
moldes do mensalão, perpetuar-se no poder obtendo recursos para seu partido e
também enriquecer ilicitamente. “Temos um projeto de poder estabelecido com
base nas propinas, daí a propinocracia”, definiu Dallagnol. De acordo com a
acusação, a atuação de Lula “garantiu, durante seu mandato presidencial, uma
governabilidade assentada em bases criminosas, mediante compra de apoio
político”. O ex-presidente ainda teria formado “em favor do seu partido, o PT,
um colchão de recursos ilícitos para abastecer futuras campanhas eleitorais, no
contexto de uma perpetuação criminosa de poder”.
A denúncia se baseia em três acusações principais
contra Lula e relacionadas à empreiteira OAS: corrupção passiva no valor de R$
87,6 milhões, que foram desviados pela empresa em três obras da Petrobras;
lavagem de dinheiro no valor de R$ 2,4 milhões pela aquisição e reformas feitas
pela empreiteira no triplex no Guarujá e de R$ 1,3 milhão pela armazenagem de
seus bens pessoais feita por uma empresa custeada pela empreiteira.
NO CENTRO
DE TUDO Segundo Deltan Dallagnol, Lula dominava toda a estrutura por ele
montada, com plenos poderes para decidir sobre sua prática, interrupção e
circunstâncias.
Esta é a segunda denúncia contra Lula na Lava Jato,
mas a primeira em que ele é acusado diretamente de corrupção. A primeira foi
feita pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, imputando a ele a
obstrução de investigações de organização criminosa – Lula seria o mandante de
pagamentos para evitar a delação premiada do ex-diretor da Petrobras Nestor
Cerveró. Neste caso, que está na Justiça Federal do DF, o ex-presidente já é
réu e a primeira audiência de instrução e julgamento está marcada para 8 de novembro,
conforme antecipou ISTOÉ em sua última edição. A nova denúncia, feita por
Curitiba, ficará com o juiz federal Sérgio Moro. Nos bastidores da Justiça
Federal, a expectativa é de que Moro delibere sobre a abertura do processo já
no início desta semana, o que pode tornar Lula réu em sua segunda ação penal.
“Nesse esquema criminoso, Lula dominava toda a estrutura por ele montada, com
plenos poderes para decidir sobre sua prática, interrupção e circunstâncias. O
esquema perdurou por, pelo menos, uma década. Diversas pessoas próximas a Lula
e da cúpula do PT, que faziam parte desse arranjo criminoso, já foram
denunciadas por seu envolvimento em crimes de corrupção e lavagem de dinheiro,
reforçando o caráter partidário e verticalizado do esquema criminoso”, escreveram
os procuradores na denúncia. A relação dessas pessoas com Lula foi listada como
indício de que ele era o ponto convergente do esquema criminoso. Dentre eles, o
Ministério Público cita o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, o pecuarista
José Carlos Bumlai e o ex-tesoureiro João Vaccari Neto, todos atualmente presos
na Lava Jato.
Recentes delações premiadas
robusteceram a denúncia
dos procuradores da República contra o petista
dos procuradores da República contra o petista
Diversas delações premiadas robusteceram a
denúncia. Sobre a indicação de diretores pelos partidos políticos com o
objetivo de arrecadar recursos lícitos e ilícitos, o ex-líder do governo no
Senado, Delcídio do Amaral (ex-PT-MS), afirmou que “Lula sabia ‘como as coisas
funcionavam’” e sabia “como a ‘roda rodava’, embora pudesse não ter
conhecimento das especificidades”. Já o ex-deputado Pedro Corrêa (PP-PE)
relembrou quando seu partido indicou Paulo Roberto Costa para a diretoria de
Abastecimento da Petrobras e o Conselho de Administração não queria aprovar a
nomeação, o que causou uma crise política entre o governo Lula e o Congresso
Nacional, com o trancamento de diversas pautas. “Somente Lula teria força para
resolver essa nomeação. O presidente Lula tinha conhecimento de que a
manutenção do PP na base aliada dependeria da nomeação da Diretoria, sabendo
que o interesse era financeiro e arrecadatório, pois esta era a base inicial de
negociação com o governo”, relatou. Segundo Pedro Corrêa, o petista chegou a
ameaçar destituir todo o Conselho de Administração da Petrobras caso não
aprovassem a indicação de Paulo Roberto Costa. No fim, ele acabou sendo
nomeado.
No mesmo dia da denúncia do MPF, os advogados de
Lula correram para tentar desqualificar os indícios de que a cobertura no
Guarujá foi preparada, reformada e mobiliada em benefício de Lula. Os
argumentos, porém, deixam um inequívoco fio desencapado. A cota-parte de um
apartamento teria sido adquirida por Marisa Letícia em 2005, mas só nove anos
depois a família foi visitar o apartamento para saber se queria mesmo comprá-lo
e só em 2015 entrou na Justiça para reaver o dinheiro aplicado. A versão não
pára em pé. O Ministério Público, por sua vez, sustenta com evidências mais
substanciosas que o apartamento e a armazenagem de bens foram parte de
pagamentos de vantagens obtidas ilegalmente pela OAS em contratos na Petrobras.
Nas próximas semanas, Lula não deverá ter sossego, como deixou clara a própria
força-tarefa da Lava Jato. “O trabalho não para aqui, as investigações
continuam. Essa é uma primeira resposta aos crimes praticados pelo senhor
Lula”, afirmou Deltan. Independentemente do desfecho, e de quando o desenlace
se dará, a casa caiu para o ex-presidente. Um vaticínio já se impõe: se não for
impedido pela Lei da Ficha Limpa, dificilmente o petista terá musculatura
política e eleitoral para concorrer às próximas eleições presidenciais.
Nenhum comentário:
Postar um comentário