Força demolidora de Cunha é uma suposição que contradiz o resultado da
cassação
Por Augusto
Nunes, 24/10/2016,
www.veja.com.br
Texto de Dora Kramer publicado no Estadão
Eduardo Cunha não foi o primeiro nem será o último
político de destaque a ser preso pela operação Lava Jato. Sequer pode ser
apontado como aquele que maior poder e/ou volume de informações reuniu na
República. As presenças de José Dirceu e Antônio Palocci em Curitiba – chefões
da era em que o PT mandava (e principalmente desmandava) no País – dão por si
tal testemunho.
Pode ser que ele venha a fazer uma delação
devastadora que comprometa do baronato ao cardinalato da política? Pode ser que
haja vida em Marte. No terreno das possibilidades criam-se, entre outras coisas,
fantasmas. Tudo é possível embora nem tudo seja provável. Para dirimir
quaisquer dúvidas, o melhor método é o exame das condições objetivas.
A principal delas esteve registrada no placar
eletrônico da Câmara no dia 12 de setembro último, quando o então deputado
afastado de suas funções legislativas pelo Supremo Tribunal Federal teve o
mandato cassado por 450 votos a favor e 10 contra.
No início, quando o processo foi aberto no Conselho
de Ética, a avaliação preponderante era a de que Eduardo Cunha sairia ileso.
Segundo essa versão, teria poderes ilimitados para impedir o andamento dos
trabalhos e um embornal de informações a respeito de seus pares tóxico o
suficiente para garantir votos a favor da manutenção de seu mandato.
No campo da suposição, isso parecia fazer sentido.
Mas a realidade tem componentes menos esquemáticos. No caso, a opinião pública,
a revelação de novas e cada vez mais contundentes acusações, o comportamento
excessivamente ousado de Cunha, a decisão do STF de afastá-lo do cargo, a impossibilidade
de contar com ajuda do governo, o instinto de sobrevivência eleitoral dos
deputados, uma série de fatores que desmontou a presunção inicial e produziu um
resultado surpreendentemente desfavorável a ele.
A prisão menos de quarenta dias depois provocou
alvoroço, não obstante fosse algo esperado, líquido e certo. Fez-se o silêncio
em Brasília. Pudera, dizer o quê? Lamentar, comemorar? O governo e mundo
político em geral não poderiam fazer uma coisa nem outra. Até o PT se manteve
discreto, dada sua impossibilidade de falar de corda em casa de enforcado.
Enquanto na capital federal a palavra de ordem era
não passar recibo, no restante do País estabeleceu-se a gritaria em torno dos
presumidos efeitos de uma delação premiada. Por ora apenas um fantasma nessa
ópera composta pela operação Lava Jato. Não que seja um equívoco supor que
Cunha faça delação e provoque com ela uma devastação em massa. Mas é preciso
medir e pesar as circunstâncias. E estas não lhe são necessariamente
favoráveis.
Não é ele quem dita às regras muito menos o rumo
dos acontecimentos como, de resto, já ficou demonstrado. A faca e o queijo
estão nas mãos do Ministério Público e da Justiça. Ainda que o ex-deputado
tenha disposição de delatar não significa que os procuradores se interessem
pela contrapartida ou que as condições estabelecidas em lei para a obtenção de
benefícios se apliquem a Eduardo Cunha.
A força tarefa da Lava Jato trabalha há mais de
dois anos, período em que reuniu uma montanha de informações a respeito das
quais seguramente o País ainda não sabe da missa a metade. De onde é possível
que o ex-deputado não tenha dados que os investigadores considerem novos e/ou
necessários ao esclarecimento dos fatos. Se não pôde controlar seu destino
quando presidente da Câmara nem se utilizar do arsenal intimidador de maneira
eficiente, não será preso que Eduardo Cunha terá êxito no manejo da figura de
assombração.
Ademais, terá de ter muito cuidado com o que disser
para não piorar sua já sofrível situação.
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