Marchar contra políticos é uma má
escolha; sem eles, resta o quê? A imposição do mais forte?
Por Reinaldo
Azevedo, 29/11/2016,
www.veja.com.br
Sempre considerei aqui, e eu estava certo,
que o papo-furado da anistia era mero pretexto para tentar inflamar as ruas.
Infelizmente, há grupos, correntes e pessoas que não sabem ter agenda
propositiva: se esta não é destrutiva, eles simplesmente não têm o que dizer.
Desaparecem da vida das pessoas e do noticiário. Para certos comportamentos, um
governo que desse certo seria um martírio. Imagine que sofrimento seria ter de
dizer “sim” a alguma coisa. Muito mais charmoso é fazer o contrário. Por que
afirmo isso?
A possibilidade de haver anistia a
políticos que cometeram os mais variados crimes; ainda que associados ao caixa
dois é inferior a zero. Não vai acontecer. A entrevista coletiva de Michel
Temer, Renan Calheiros e Rodrigo Maia já deixou isso claro. Se preciso, a coisa
morre no gabinete do presidente. Se ali não morresse, sucumbiria no Supremo.
Pronto! Não vai haver anistia. Mas leio
aqui e ali que tanto esquerdistas como alguns não esquerdistas querem manter o
tal protesto no dia 4. Não era contra a anistia? Era. Anistia não haverá. Então
agora será por quê? Não dá pra saber. Mas parece que é contra, como é mesmo? O
jeito corrupto de fazer política no Brasil.
Não sei se a coisa prospera ou não. Uma
pauta, com essa definição, é de tal natureza ampla que tudo pode acontecer. O
cara briga com a namorada, ou ela com ele, e logo vem aquela vontade de gritar
“Fora Temer”! Bem, é desnecessário dizer que as esquerdas estão sorrindo de
orelha a orelha. Gente que chamava defensores do impeachment de “golpistas” não
está vendo mal nenhum numa aliança eventualmente episódica com os adversários.
Afinal, é preciso derrubar Temer.
É lamentável que as coisas estejam
tomando essa configuração porque, se a ação fosse bem-sucedida, o que teríamos
nas ruas seria uma miríade de insatisfações várias, pautadas por certa sensação
de que tudo o que dá errado no país e na vida privada das pessoas deve ser
creditado aos políticos. Por contraste, sem eles, talvez a vida fosse bem
melhor, o que é, todos sabem, uma bobagem rematada.
Ora, combater a corrupção e meter larápios
em cana, na forma da lei, há de ser um pressuposto, não um norte a ser seguido,
não um ponto de chegada. É preciso descobrir urgentemente a agenda propositiva.
Convém não brincar com fogo. Os 12
milhões de desempregados não vão esperar que primeiro se proceda ao saneamento
da política para que, então, o país comece a responder às reais demandas do
povo brasileiro. Esse espírito é, de fato, preocupante.
Não por acaso, as esquerdas começam a
ver com simpatia esse estímulo ao ódio à política, alimentado por grupos com
sotaque de direita. Ainda voltarei ao assunto, sim, mas ponha uma coisa na
cabeça, meu querido leitor: esse comportamento é contra o seu interesse e nunca
termina bem.
Uma coisa é marchar contra a anistia,
caso ela existisse. Outra, diferente, é propor uma ação pública contra os
políticos. Alguém tem alguma ideia melhor sobre quem deveria conduzir a
representação democrática?
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