Tanto o PT quanto o PMDB tentaram
acabar com a Operação Lava Jato, mas não conseguiram. Isso mostra força inédita
dos órgãos de combate à corrupção no país
Por Sergio
Praça, 14/09/2016,
www.veja.com.br
O Ministério Público Federal acaba de denunciar o
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pelos crimes de corrupção passiva,
lavagem de dinheiro e falsidade ideológica (mais detalhes aqui e aqui). A denúncia é feita pelos integrantes da força-tarefa da Operação Lava
Jato, que investiga corrupção no país desde o início de 2014 e é comandada pelo
Ministério Público Federal e a Polícia Federal. Criticada por ser
“antidemocrática”, “violadora de direitos civis” e “partidária”, a Lava Jato
pode ser tudo, menos isso.
Prova da independência da investigação é o fato de
desagradar igualmente membros do PT e do PMDB, os dois partidos que estão no
poder desde 2003. Até muito recentemente, é claro, o PMDB era coadjuvante. (Em
2015, com a ascensão de Eduardo Cunha (PMDB) à presidência da Câmara dos
Deputados, o PMDB passou a ser protagonista, até tomar o poder com o
impeachment de Dilma Rousseff (PT).)
Em ao menos quatro momentos desde o início da
força-tarefa, políticos do PT e do PMDB tentaram afetar a investigação ou seus
efeitos.
O primeiro, mais teatral, foi a tentativa de obstruir
a justiça feita por Lula e o então senador Delcídio do Amaral (PT) ao
oferecerem dinheiro para que Nestor Cerveró, ex-diretor da área Internacional
da Petrobrás, fugisse do país antes de revelar mais informações à Lava Jato. De
acordo com documentos obtidos pelo “Valor Econômico”, Cerveró teria dito aos procuradores que a
campanha de reeleição de Lula em 2006 se beneficiou de R$ 50 milhões em propina
através de negócios da Petrobras na África. Além disso, Cerveró contou, em sua
delação premiada, que um assessor de Delcídio havia revelado, na noite anterior
ao seu depoimento em uma das CPIs da Petrobras, as perguntas que lhe seriam
feitas pelo relator da comissão, o senador José Pimentel (PT) (Ver a página 135
da delação de Nestor Cerveró)
Após a revelação da tentativa de obstrução,
Delcídio foi preso e cassado pelos seus colegas no Senado Federal, e Lula virou
réu em processo do Ministério Público em Brasília (diferente da força-tarefa da
Lava Jato).
A segunda tentativa foi através da edição da Medida Provisória 703/2015, que alterou a Lei Anticorrupção (12.846/2013) para dispor sobre acordos de leniência.
Esses acordos são celebrados entre o governo e empresas envolvidas em
corrupção. Trata-se de dar vantagens à primeira empresa que confessar ser
integrante do esquema – ponto retirado pela MP 703, que estende isso a todas as
empresas (veja aqui a excelente análise dos economistas Vinicius Carrasco e João
Manoel Pinho de Mello.)
Ao editar essa medida no fim de dezembro de
2015, o governo Dilma tinha como intenção aliviar a barra de empresas corruptas
e diminuir os incentivos para que novas informações sobre os crimes fossem
reveladas. A Medida Provisória não foi aprovada pelo Congresso Nacional e,
atualmente, os acordos de leniência estão frágeis juridicamente por conta da disputa entre órgãos de controle como
o Ministério da Transparência, o Tribunal de Contas da União e o Ministério
Público Federal para comandá-los.
Além do PT, o PMDB também fez sua parte para tentar
atrapalhar a Lava Jato. O ex-senador pelo PSDB e ex-presidente da Transpetro
Sérgio Machado, investigado pela força-tarefa, decidiu se defender gravando
conversas comprometedoras com os peemedebistas Romero Jucá (ex-ministro do
Planejamento de Michel Temer, hoje senador), Renan Calheiros (presidente do
Senado Federal) e José Sarney (ex-presidente da República e ex-presidente do
Senado Federal). A intenção era pressionar o Judiciário, especialmente o Supremo Tribunal Federal, para
que as punições por corrupção parassem antes de chegar à cúpula do partido.
Resultados? Jucá perdeu o cargo de ministro, mas
continua um senador influente, Calheiros é o senador mais importante do Brasil
e Sarney está curtindo a aposentadoria.
Por fim, o quarto caso foi a nomeação de Fabiano
Silveira, advogado próximo de Renan Calheiros, para o Ministério da
Transparência, Fiscalização e Controle (ex-Controladoria-Geral da União). Após
a perda de validade da Medida Provisória 703, os acordos de leniência com
empresas corruptas voltaram a ser tarefa do Ministério da Transparência.
Comandar esse ministério, portanto, seria fundamental para, no mínimo,
controlar informações sobre possíveis empresas “delatoras”. O então presidente
interino Michel Temer achou por bem nomear Fabiano Silveira, flagrado nos grampos de Sérgio Machado como
conselheiro de Renan Calheiros, para o cargo de ministro.
A reação dos funcionários da antiga CGU foi
visceral e o atual ministro é o advogado Torquato Jardim, mais próximo de Temer
e que tem tomado iniciativas de diálogo com outros órgãos de controle – apesar
de ainda não ter a simpatia da maioria dos auditores do ministério.
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